domingo, julho 29, 2007

Contos da cia 2

Paraguai vai preso

Paraguai, recém chegado na cidade grande, chega em casa do trabalho.

-Lola! Lola!
...
- E agora? Tô sem a chave do portão...

Pluft!

­­-Pelo menos, a chave da casa está aqui, bem debaixo do tapete...

Pampampam Poum

­­-É a polícia! Mão pra cabeça!
-Que houve, moço?
-Você está preso em flagrante! Invasão à residência e tentativa de assalto!
-Não! Eu moro aqui!
-Prova!
-Meu Deus!
-O senhor foi visto pulando o muro!
-É que esqueci a chave do portão. Chamei minha esposa e ela não tava, aí tive que pular, né?
-Prova que o senhor mora aqui!
-Não posso!Posso! Tão vendo aquela casa lá! É a do rapaz que me alugou essa casa! Perguntem pra ele!

-Não tem ninguém lá! O senhor vai preso!
-Preso?Eu não fiz nada!
-Preso, pois não pode provar que mora aqui. O senhor foi flagrado pulando o muro. Temos que te levar!

Dias depois...

-Stênio, o Paraguai está sumido... Ele não veio nesse fim de semana para casa... Fui, hoje cedo, lá no trabalho dele, lá também ele tá sumido...
-Eita! O que será que aconteceu com ele? Vamos lá mais tarde de novo.

-Quero falar com o delegado!
-Cala a boca aí!
-Tô aqui há dias! Fui preso injustamente e dentro da minha casa!
-Cala a boca aí!
-Moço, pelo amor que o senhor tem à sua mãe! Deixe-me falar com o delegado!
-Mas que merda é essa de enfiar minha mãe em tudo! Vocês ficam apelando por qualquer coisa... Dessa vez vai, na próxima... Dou-te com os dois pés nos peitos.

-O que é que você manda!
-Doutor, por favor, me deixa sair daqui! Me prenderam sem motivo, só porque não pude provar que eu moro naquela casa... Não tinha ninguém pra me ajudar naquela hora... Minha mulher deve estar preocupada, vou acabar perdendo o emprego...
-Quer dar um telefonema?
-Quero.
-Carcereiro, leve o homem até a minha sala.

-E então, não vai ligar?
-Não sei pra onde... Não sei o telefone de ninguém... Doutor, cheguei essa semana aí, só aluguei a casa pra minha esposa morar e comecei a trabalhar... não conheço muita gente...
-Assim fica difícil, né?

-Vou te dar uma chance, mas será a única: me dá o seu endereço que aí eu vou lá averiguar. Se a sua esposa confirmar o que você me diz, eu volto aqui e deixo você sair. Se não, aí eu lhe transfiro você sabe pra onde!
-Está bem, Doutor, muito obrigado. Que Deus lhe pague!

-Paraguai!
-Fui à sua casa. Não sei se você vai gostar de saber o que há lá fora...
-Fale homem! Aconteceu alguma coisa com a minha Lola?
-Pois é...
-Não sei como dizer...
-Fale homem, fale que sou macho!
-A sua esposa...
-Ande!
-Então, ela disse que faz dez dias que você está longe do emprego e de casa, acha que você fugiu com a vizinha...
-Ah meu Deus!
-Aí...
-Fale homem!
-Aí... ela...
-Ande homem, veja meu coração!
-Aí, como ela foi uns cinco dias lá no seu serviço... Sabe aquele chileno?
-Sei!
-Então, a Lola, o Chileno...
-Fala!
-Então, a Lola chamou o Chileno pra morar com ela...

Pumba!

-Paraguai!
-...
-Paraguai!
-...
-Acorda cabra-macho!
-Ah? O que foi? Sonhei que o doutor me dizia que minha esposa tinha arrumado outro...
-Acorda que não foi um sonho.
-Ah que bom... Ah? Não foi um sonho?
-Não, acabei de lhe contar tudo o que vi na sua casa, e você não agüentou...
-Doutor! -Calma, rapaz!
-Você também perdeu o emprego!
-Ah?
-Acho melhor você ir ficando por aqui... Ao menos, aqui não vai faltar o teto e nem a comida.
Pumba!

Contos da cia

Hora de dormir

Stênio e sua mulher estão prontos para dormir, quando Stênio inicia uma conversa.

-Me ocorreu um fato!
-Que fato, homem?
-Sabe, tô pensando em denunciar aqueles filhos-da-mãe por terem me prendido naquele dia.
-Mas você vai denunciar o que?
-Eles me algemaram só porque eu arranhei o carro daquele homem, depois, me tomaram a carteira de motorista e me deixaram preso por cinco dias.
-Tá que tudo isso foi injusto, se bem que poderia ter sido justo...
-Como assim, tá louca?!
-Ah, e se não tivesse sido só um arranhão? E se você estivesse em alta velocidade e...
-Tá, mas não foi o caso. Eles me usaram para dar exemplo ao povão.
-E daí? O que importa é que você e o carro estão aqui. Tudo já foi resolvido.
-Eu não aceito sair dessa assim... E os danos morais e materiais que sofri com tudo isso?
-Mas você não disse que foi uma terapia aqueles cinco dias na cadeia, que você comeu melhor do que nunca e fez amigos para sempre?
-Tá, e a vergonha de ter saído da vila algemado e ter sido exposto aquelas malucas das minhas ex-mulheres, de ter chego lá no marmitão algemado, sujo, malacabado? Pior mesmo foi ter visto na cara da maluca-mor a satisfação de me ver naquela situação.
-Tá... E o que você quer fazer? Ir à corregedoria e fazer um boletim de ocorrência denunciando abusos da polícia? Vai onde para processar o juiz que te indeferiu a soltura, no primeiro dia, e ordenou reclusão em regime fechado até o dia do julgamento? E depois? Já pensou nas conseqüências?
-Ah, mas esse mundo precisa de justiça. O mundo está como está porque as pessoas não fazem suas denuncias de abuso de poder e tudo se dará sempre como se deu comigo: Cidadãos honestos sendo presos e expostos ao ridículo por conta de eventualidades. Eu não matei ninguém! Stênio acende um cigarro. E mesmo que tivesse matado, se foi um acidente...
-Tá, você já pensou que a polícia e o juiz que estão envolvidos na questão poderiam querer se vingar de você?
-E eu? Não tenho o direito de me vingar deles?
-Ter, você tem. Mas quem é você?
-Como assim?
-Você é algum empresário de renome? É político quente? É parente de algum magnata ou mafioso?
-Não...
-Está aí! Você é um pobre doutor, mero pesquisador, dono de um importado e de um terno. Só isso, mais nada! Que poder você tem? Nenhum!
-É... Você tem raz...
-Pois é. Daí, qualquer dia você desaparece. Passa algum tempo, você aparece morto no Pantanal, e o carro jogado num beco do Rio Tavares. E aí? Terá sido um seqüestro, como os de São Paulo?
-É né?!
-Ou pior, lembra do caso do PC Farias e sua namorada? Assassinato seguido de suicídio. Um crime passional. Você acredita?
-Escuta!
-O que? Ahhh! Lá fora!
-Alguém abriu o portão?
-Abriu.
-Liga pra polícia!
-A linha...